(8/5/2019) O presidente da DFG, Prof. Peter Strohschneider, esteve em São Paulo de 1º a 3 de maio por ocasião do encontro anual do Global Research Council (GRC). Sediado pela primeira vez na América do Sul, o evento reuniu representantes de 52 organizações de fomento científico de 50 diferentes países e foi organizado conjuntamente pela DFG, FAPESP e CONICET (Consejo Nacional de Investigaciones Científicas e Técnicas da Argentina).
Este ano o encontro teve como tema central a crescente expectativa dos organismos financiadores, como governos e gestores de fundos públicos, sobre o impacto econômico e social de pesquisas científicas.
A questão, que vem desafiando agências de fomento no mundo todo, apresenta-se em dois momentos diferentes. Primeiramente o desafio consiste em estimar o impacto de futuras pesquisas, antes mesmo que elas sejam desenvolvidas. Ou seja, a partir das propostas submetidas pelos pesquisadores, prever o potencial impacto dos projetos sem mesmo saber quais serão seus resultados. Esta demanda surge de alguns governos e de parcela da população que reivindicam que a geração de impacto deveria ser um dos critérios considerados pelas agências na seleção de projetos e na distribuição de fomento. Tal concepção comprometeria diretamente o fomento de pesquisa básica que, sem o ímpeto de aplicação imediata, preocupa-se essencialmente em responder perguntas que nascem da curiosidade dos cientistas.
Em um segundo momento, a demanda por impacto científico desafia as agências em como mensurar e avaliar impacto a partir dos resultados de projetos já fomentados e concluídos.
Conforme explicou Jorge Tezon, Diretor de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do CONICET, agência nacional de fomento argentina, um dos problemas enfrentados é o intervalo de tempo entre o fim de um projeto e a surgimento de impacto: “Em alguns casos pontuais isto é imediato. Em outros, temos que esperar alguns anos”. “Ou décadas”, completou o Prof. Strohschneider: “Se pensarmos na teoria da relatividade: demorou 80 anos para que isso mostrasse seu impacto no desenvolvimento das tecnologias de GPS”, exemplificou.
Segundo o presidente da DFG, uma série de ideias equivocadas a respeito da ciência tangenciam o debate sobre geração de impacto. Uma delas consiste em considerar que o propósito único da ciência seja entregar, em pouco tempo, soluções concretas para problemas atuais. Para Strohschneider, esta é apenas uma das funcionalidades dos sistemas de pesquisa modernos e seria um erro generalizar esta particularidade para todo o sistema e disciplinas. “A mais importante funcionalidade do sistema de pesquisa moderno é desenvolver metodologias e conhecimentos novos, que poderão ajudar a sociedade a resolver não apenas os problemas que conhecemos agora, mas também os problemas do futuro – que ainda nos são desconhecidos”, declarou.
De acordo com o Prof. Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, outra concepção errônea é esperar que a ciência gere conhecimento inovador e soluções imediatas a partir do nada. “É impossível entregar soluções hoje sem partir do conhecimento criado por gerações anteriores e acumulado ao longo de séculos. Isso faz com que as pesquisas levem tempo e que as respostas demorem, frustrando essa expectativa de soluções a curto prazo”, relatou.
Tezon também adicionou mais um item à lista de equívocos: esperar que a ciência apresente uma solução única e certeira para os problemas enfrentados. “É um desafio o público geral entender que os problemas são complexos e interdisciplinares – não existe resposta única que dê conta de problemas como desemprego ou ao alcoolismo e à dependência química”, exemplificou.
Diante destas considerações, o presidente da DFG defendeu que a discussão sobre impacto não deve seguir uma abordagem ideológica, mas sim metodológica. “Nenhum cientista é contra impacto, ninguém tem a intenção de produzir conhecimento inútil. Precisamos discutir, na verdade, como os atuais sistemas de fomento de pesquisas, caros como são, podem ser explicados para a população e legitimados. Isso nos traz questões metodológicas: como mostrar e comunicar impacto, como categorizar impacto, como trazer questões de impacto nos processos políticos de tomada de decisão”, explicou.
Além do debate sobre impacto científico, o encontro do GRC em São Paulo também tratou de outros temas quentes que tangenciam o universo científico. Sessões temáticas discutiram a importância da igualdade de gênero na ciência; OpenScience, movimento pelo acesso aberto universal ao conhecimento científico; e desenvolvimento sustentável.
Todas estas questões foram previamente debatidas pelas agências do GRC em discussões regionais nos cinco continentes do planeta durante o ano passado, e as conclusões compiladas em uma Declaração de Princípio. O documento, endossado em plenária no encontro anual em São Paulo, defende uma abordagem equilibrada entre a ciência básica e a ciência voltada a aplicação; a prevalência do critério de mérito na seleção de projetos para o financiamento e que a avaliação do impacto social e econômico dos estudos tenha abordagem flexível. A Declaração de Princípios, que servirá como referência para as agências de fomento, recomenda ainda a adoção de estratégias de comunicação mais eficazes para que os resultados de pesquisas financiadas cheguem à comunidade científica, sociedade e governo.
Na Alemanha
Dentro do amplo sistema científico alemão, as variadas organizações de fomento possuem competências diferentes. A DFG é organização que lidera o fomento à pesquisa básica. Com um orçamento anual de cerca de 3 bilhões de euros, oriundo majoritariamente dos governos federal e estaduais, cabe a ela financiar a pesquisa pautada pela curiosidade. O critério de seleção de proposta baseia-se no mérito científico. Orientada pelo princípio bottom-up (“de baixo para cima”), a DFG atende à livre demanda dos cientistas, que desfrutam de liberdade para definir a temática de suas pesquisas. As pesquisas que se orientam para a geração mais imediata de impacto social e econômico são geralmente fomentadas pelo próprio Ministério Federal da Educação e Pesquisa, que dispõe de um fundo para financiamento de áreas prioritárias ao governo.
Sobre o GRC
Constituído em 2012, o Global Research Council tem entre seus objetivos melhorar a comunicação e a cooperação entre os conselhos nacionais de pesquisa, além de promover o compartilhamento de dados e melhores práticas para uma cooperação de pesquisa de alta qualidade. A organização tem como presidente e vice-presidente Vladislav Panchenko, da Russian Foundation for Basic Research, e Alejandro Ceccatto, do CONICET (Argentina), respectivamente. A DFG é membro ativo da organização e ocupa posições importantes no Governing Board e Programme Committee. Além disso, está também representada no Grupo de Suporte Executivo e no Grupo de Trabalho sobre Gênero, bem como nos encontros regionais, que contam com a participação dos coordenadores de cooperação internacional da DFG.
Durante o encontro anual em São Paulo, o diretor científico da FAPESP, Prof. Brito, foi eleito o novo presidente do conselho do GRC.
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